Escrito por: Dr. Luciano Tavares – Advogado Especialista em Direito Médico e da Saúde
Em um tratamento médico, é comum que apesar de ser tecnicamente adequado, venha ocasionar danos ao paciente, levando à rotulagem equivocada de erro por parte do profissional de saúde. Essa confusão surge da falta de distinção entre a obrigação de proporcionar cuidados médicos (obrigação de meio) e a expectativa de uma cura definitiva (obrigação de resultado). É crucial compreender que a medicina não é uma ciência exata e nem promete a cura absoluta, mas sim a prestação de cuidados diligentes e prudentes, visando à cura, o que caracteriza uma obrigação de meio. Estado assim a conduta do profissional de saúde em conformidade com o disposto no Código Civil, bem como no Código de Defesa do Consumidor.
Mesmo quando o profissional da saúde demonstra máxima diligência e utiliza as melhores técnicas e medicamentos disponíveis, ainda assim existe o risco de o paciente sofrer danos devido a circunstâncias patológicas, resultando na chamada iatrogenia. A iatrogenia refere-se a efeitos adversos ou alterações patológicas decorrentes de um tratamento adequado e dentro dos padrões recomendados, podendo ser previsíveis, esperados, controláveis ou, às vezes, inevitáveis. No entanto, tais efeitos não são necessariamente prejudiciais e, em alguns casos, podem até ser até benéficos.
É essencial enfatizar que a iatrogenia não implica em responsabilidade civil para o profissional da saúde, pois decorre de uma ação tecnicamente correta e benéfica. Em contrapartida, o erro médico, resultante de conduta negligente, imprudente ou imperita do profissional, pode gerar responsabilidade civil pelos danos causados ao paciente.
Para que a conduta do profissional da saúde venha a ser considerada erro é necessário que sua conduta profissional por ação ou omissão tenha sido diretamente responsável pelo dano ao paciente, demonstrando negligência, imprudência ou imperícia.
A responsabilidade civil é um conceito legal que estabelece que uma pessoa ou entidade possa ser responsabilizada por danos causados a outra parte devido a sua conduta negligente, imprudente ou imperita. Em outras palavras, quando alguém causa prejuízos a outra pessoa por não agir de acordo com os padrões aceitáveis de cuidado, essa pessoa pode ser considerada responsável legalmente pelos danos causados e, portanto, obrigada a repará-los.
No contexto da prática médica, a responsabilidade civil muitas vezes surge quando um profissional de saúde, como médico, enfermeiro ou hospital, não cumpre o dever de cuidado devido ao paciente, resultando em danos físicos, emocionais ou financeiros. Nesses casos, a parte prejudicada pode buscar compensação financeira por meio de uma ação judicial, alegando negligência, imprudência ou imperícia por parte do profissional ou instituição de saúde.
Mas como distinguir a conduta que viola a responsabilidade civil da iatrogenia?
Por exemplo, em casos onde o paciente possui uma doença rara, não diagnosticável anteriormente, que é desencadeada pelo tratamento de uma doença simples, como uma gripe, é injusto responsabilizar o médico pelos danos irreversíveis.
É uma premissa no Direito que mesmo que exista uma violação ao direito material, é necessário haver provas que evidenciem a violação a tal direito. No contexto de ações de responsabilização por erro médico a exigência de provas técnicas é mais do que necessária, é uma regra.
Ao iniciar uma ação judicial envolvendo questões médicas, é crucial compreender a diferença entre iatrogenia e erro médico. Essa distinção pode ser a linha tênue entre o sucesso e o fracasso do processo.
Uma das formas de evitar processos temerários é buscar, antes de propor a ação de reparação civil por erro médico, construir de forma substancial a prova de que o ato médico foi realizado por negligência, imprudência ou imperícia, por meio de uma ação de produção antecipada de provas.
Uma ação de produção antecipada de provas em um contexto de erro médico é um procedimento legal pelo qual a parte interessada, geralmente o paciente ou seus representantes legais, solicita ao Poder Judiciário a obtenção e preservação de evidências relevantes antes de iniciar formalmente um processo judicial por erro médico. O que busca apontar se o ato supostamente danoso por erro médico, foi de fato um erro, ou um ato de iatrogenia.
Em casos de suposto erro médico, as evidências podem incluir o pedido de perícias, de análise de registros médicos, resultados de exames, relatórios de diagnóstico, depoimentos de testemunhas, entre outros.
A ação de produção antecipada de provas em casos de erro médico é crucial para garantir que todas as evidências relevantes sejam preservadas e disponibilizadas para uso posterior no processo judicial principal por reparação de danos.
A iatrogenia e o erro médico são, portanto, conceitos distintos, pois a presença de iatrogenia impede a responsabilização por erro médico, já que não houve violação do dever de cuidado por parte do profissional. Sem fortes evidências de que o ato realizado tenha de fato relação com a violação do dever de cuidado, é inadequado propor uma ação judicial única para discutir reparação de danos, sem uma prova concreta de desobediência a responsabilidade civil.
Dado que a medicina não é uma ciência exata e que circunstâncias imprevisíveis podem surgir, é crucial realizar uma investigação minuciosa da conduta do profissional antes de buscar sua responsabilização, pois nem toda consequência danosa resulta de um erro médico.